A história de Sousa Brandão

Sousa Brandão, o homem dos caminhos de ferro e defensor das classes operárias, foi deputado pela Vila da Feira, General do Exército Português e fundador do Partido Republicano

Sousa Brandão, o homem dos caminhos de ferro e defensor das classes operárias

Francisco Maria de Sousa Brandão, contando apenas 15 anos de idade, corria o ano de 1833, entusiasmado pelas ideias liberais, saiu de casa e não se sabe como, conseguiu atravessar as Linhas do Porto e correu a apresentar-se no quartel-general constitucional no dia 26 de Fevereiro de 1834.

Sousa Brandão pertencia a uma família de Mosteirô, Vila da Feira, de tradições liberais. Um irmão do seu pai, José Maria de Sousa foi fuzilado em Viseu, por pertencer à causa liberal. Mas foi o seu tio, Pantaleão de Sousa, cónego da Sé de Lamego, segundo crónicas da época, quem aconselhou, antes da sua morte, o sobrinho a seguir a carreira das armas e a juntar-se à defesa da causa da Liberdade.

Francisco Maria de Sousa Brandão nasceu no dia 11 de Maio de 1818 no Lugar de Murtosa, freguesia de Mosteirô, concelho de Vila da Feira, filho de Manuel Ferreira de Sousa Brandão e de Maria José Custódio de Sousa Brandão, e viria a morrer em Lisboa a 26 de Maio de 1892, com 74 anos de idade.

Realizou os seus primeiros estudos no seminário de Lamego, cursando Humanidades, e vivendo na casa do seu tio Pantaleão.

Em defesa da causa liberal

Um mês depois de se ter apresentado no quartel-general constitucional, a 26 de Março de 1834, teve o seu baptismo de fogo, no combate de Santo Tirso, começando já então, apesar da sua jovem idade, a revelar grande valentia e heroicidade. Viria a distinguir-se depois no combate de Lixa, em 2 de Abril, ao lado dos soldados da Divisão onde se alistara, comandados pelo general conde de Vila Flor, mais tarde Duque de Terceira. Nesta fase, entrou em todos os combates até ao dia 16 de Maio, dia em que foi ferido na batalha de Asseiceira, fazendo parte do Exército Liberal que marchou até Estremoz, onde receberia a notícia da Convenção de Évora-Monte.

Almanaque Republicano

No fim da campanha, resolveu prosseguir os seus estudos, matriculando-se na Academia Politécnica do Porto, depois passou posteriormente par a Escola do Exército, em Lisboa, seguindo o curso do Estado-Maior. Às campanhas da Liberdade, seguir-se-iam as lutas armadas dos partidos conhecidos como cartistas e cabralistas e, Sousa Brandão, fiel aos seus princípios liberais, acompanhou em Dezembro de 1846 José Estêvão, Passos César de Vasconcelos e outros liberais, a combater em Torres Vedras, onde o partido da rainha D. Maria II sairia vencedor. Promovido a tenente em 21-09-1843, foi demitido em Fevereiro de 1844 por estar implicado na tentativa de revolta de Torres Novas.

Vendo perdida a causa popular, Sousa Brandão emigrou para França, onde frequentou a École des Ponts et Chaussées, com elevado aproveitamento, tendo-se formado como “um engenheiro-civil distintíssimo” (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Página Editora).

Em Paris teria a oportunidade de aprofundar as suas ideias liberais. Com vinte anos de idade, assiste à revolução de 1848 que viria a derrubar Luís Filipe e a proclamar a República. Este facto viria a impressionar profundamente Sousa Brandão, concorrendo ainda mais para afirmar as suas ideias democráticas, que o acompanharam durante toda a sua vida.

Engenheiro distinto formado em Paris

Em 1849 regressou a Portugal e, sendo conhecido como engenheiro distinto, foi de imediato nomeado director das Obras Públicas nos distritos de Viseu, Vila Real e Bragança.

A sua carreira profissional viria a conhecer novos desenvolvimento relevantes. Com a regeneração em 1851, inicia-se uma nova época, procedendo-se a grandes melhoramentos materiais, tendo-se iniciado os primeiros estudos para a construção dos caminhos de ferro em Portugal.

Sousa Brandão foi então chamado a tomar parte nos Estudos da Linha do Leste sendo, pouco depois, nomeado Presidente da Comissão encarregada de estudar o traçado da Linha do Norte, tendo a parte do projecto da linha de Coimbra ao Porto sido elaborado por ele próprio.

A este trabalho seguir-se-iam outros, nos quais Sousa Brandão sempre se encontrava, fiscalizando os primeiros trabalhos da Linha do Alentejo, cujos estudos de Vendas Novas a Évora e a Beja foram por ele dirigidos. Elaborou igualmente os estudos das Linhas dos Caminhos de Ferro do Douro, do Minho, da Beira Alta, da Beira Baixa e também os de via reduzida do Norte. Foi ainda o engenheiro escolhido pelo Governo para proceder à inspecção definitiva da Linha da Beira Alta antes de esta ser aberta ao serviço público, “encargo de grande responsabilidade que desempenhou proficientemente”. Por diversas vezes foi designado inspector de obras públicas e foi vogal da Junta Consultiva.

Em 1854 foi encarregado de elaborar o estudo sobre o projecto de caminho-de-ferro de Coimbra ao Porto. Em 1855 foi um dos homens que colaborou nos trabalhos preliminares da linha férrea de Lisboa a Santarém, com um conjunto de engenheiros ingleses.

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A carreira militar de Sousa Brandão atingiu o posto de General-de-Divisão, a que foi promovido em 5 de Março de 1890. Foi condecorado com a medalha das Campanhas da Liberdade, algarismo nº 1, tendo sido condecorado com a Comenda da Ordem de Cristo. Em 29-04-1851 era capitão, em 15-12-1868 foi promovido a major Efectivo do Corpo de Estado Maior, em 15-04-1874 a tenente-coronel, em 21-01-1876 a coronel e em 05-03-1890 foi promovido a general de divisão.

Eleito Deputado pelo círculo da Vila da Feira

Na política, foi eleito deputado pelo círculo da Vila da Feira em 1865 e 1868. Revelou-se um ardente propagandista dos princípios liberais, advogando as suas ideias com grande energia moral. Na história da organização democrática nacional, o seu nome surge sempre ao lado dos que, no seu tempo, enalteciam os ideais republicanos. Na Câmara de Deputados, viria a revelar-se um tribuno acérrimo defensor das classes operárias e opositor ao governo de Sá da Bandeira.

Concorreu com a pena e a palavra para a fundação das primeiras associações operárias em Lisboa e Porto, tendo fundado com Vieira da Silva e Lopes de Mendonça, o “Eco Operário”, o primeiro jornal socialista que se imprimiu em Portugal, fazendo a propaganda entre as classes operárias das vantagens das Associações de Socorros Mútuos, de onde nasceria o Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas, a Fraternidade Operária, a Cooperativa Indústria Social, a Caixa de Crédito Industrial e outras, fundadas e auxiliadas por Sousa Brandão, entre as quais se conta o Banco do Povo, instituição criada com o fim de proteger financeiramente os pequenos industriais.

Funda o Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas

Tal como os “iluminados” da época e defensores das classes mais pobres, Francisco Maria de Sousa Brandão pertencia ao Grande Oriente de Portugal, cujo Grão Mestre seria António Rodrigues Sampaio (de 1852 a 1863). Em 1851, ambos fundaram o Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas, por iniciativa da Confederação Maçónica Portuguesa.

O título do Centro foi proposta de José e Silva e os seus estatutos [ver “Estatutos do Centro …”, Impr. Nacional, 1853] foram aprovados por decreto de 16 de Junho de 1853. Foram “elaborados por Francisco Maria de Sousa Brandão”. Nesses estatutos, Sousa Brandão define todo um Programa muito avançado para época e que o Centro tinha como finalidade “criar associações, difundir o ensino elementar e técnico, organizar presépios e asilos para os inválidos, estabelecer depósitos e bazares, propagar por escrito os conhecimentos de economia industrial e doméstica, aperfeiçoar os métodos de trabalho, …”” [ibidem]. Posteriormente os estatutos foram “reformados” em “sessão de 19 de Outubro de 1870”. Daí resultaria o aparecimento de comissões, “associações de classes” ou de “instrução””, porém os “novos estatutos” nunca foram aprovados pelo Governo.

Com as suas preocupações sociais, contemporâneas de muitos ideólogos defensores dos trabalhadores, Sousa Brandão escreveu um livro a que deu o nome Economia Social (primeira parte: O Trabalho), no qual eram tratados largamente os princípios da economia cooperativista.

Fundador do Partido Republicano

A proclamação da República em Espanha em 12 de Fevereiro de 1873 teve imediatas repercussões em Portugal e logo em 16 de Fevereiro um grupo de republicanos portugueses, constituído por Oliveira Marreca, Gilberto Rola, Bernardino Pinheiro, Francisco Sousa Brandão, Elias Garcia e José Fontana, promovia uma reunião em casa de Manuel Tomás Lisboa.

Em 1875, organizou-se em Lisboa o Partido Republicano, sendo Sousa Brandão um dos primeiros impulsionadores, sendo desde logo considerado um dos seus membros mais queridos e respeitados, não só pelo seu passado liberal como pela firmeza das suas convicções. Desde então, foi sempre escolhido para os principais cargos de direcção do partido, sendo eleito para fazer parte do primeiro directório que se constituiu em Lisboa. Pertenceu com José Elias Garcia ao Grupo do Pátio do Salema, juntamente com Gilberto Rola e Saraiva Carvalho. Foi também um dos fundadores do Partido Republicano em 25 de Março de 1876, tendo participado no jantar realizado no palacete da Rua do Alecrim, juntamente com Mendes Monteiro.

República

Em 3 de Abril de 1876 é eleito um directório do Partido Republicano, com 33 membros. Nasceu sob o impulso da implantação da república em Espanha, em Fevereiro de 1873. A eleição foi precedida pela reunião comemorativa da vitória eleitoral dos republicanos franceses, em casa de Mendes Monteiro, na Rua do Alecrim, ocorrida a 25 de Março anterior. É nessa altura que Rodrigues de Freitas adere aos republicanos.

O primeiro centro eleitoral. 1876

O primeiro Centro Eleitoral Republicano-Democrático será inaugurado no dia 20 de Julho seguinte. Entre os participantes, António de Oliveira Marreca, Latino Coelho, Bernardino Pinheiro, Francisco Maria de Sousa Brandão, Gilberto António Rola, João Bonança, José Carrilho Videira, José Elias Garcia, José Jacinto Nunes, Zófimo Consiglieri Pedroso.

Novo directório em 1879

Em 3 de Fevereiro de 1879 é eleito novo directório, com Oliveira Marreca, Latino Coelho, Francisco Sousa Brandão, Bernardino Pinheiro e Eduardo Maia. Nessa eleição participam os federalistas. Nesse ano, nas eleições de 19 de Outubro de 1879 voltava a ser eleito solitariamente o republicano Rodrigues de Freitas pelo Porto.

Francisco Maria de Sousa Brandão pertenceu por três vezes ao Directório do Partido Republicano, uma logo em 3 de Abril de 1876, outra em 3 de Fevereiro e 1879 e a outra em 22 de Dezembro de 1887. A partir de Janeiro de 1891 passou a integrar a denominada Junta Consultiva do Partido.

Dezoito anos depois da sua morte, a República viria a ser implantada.

Autor: mosteirofeira

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